Direito à matrícula após decisão do STF que estipulou data corte até 31 de março

Direito de matrícula – Data corte até 31 de março: como interpretar, juridicamente, a decisão do STF que estipulou data de corte até 31 de março para ingresso no Ensino Infantil e Fundamental.

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Muitos de vocês, meus leitores, assim como alguns clientes meus, devem estar assustados, com a notícia que veiculou, hoje, sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, por seis votos a cinco, julgou constitucional a fixação da data limite de 31 de março, para que estejam completas as idades mínimas de quatro e seis anos para ingresso, respectivamente, na educação infantil e no ensino fundamental. A decisão da Corte foi tomada, nesta quarta-feira, (1º) na conclusão do julgamento conjunto da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 17 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 292,que questionavam exigências previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) e em normas do Conselho Nacional de Educação (CNE).

O texto pode parecer um pouco extenso, mas procurei ser o mais didática possível e esclarecer várias dúvidas que têm surgido entre os meus leitores e clientes, sobre este tema: como cada Estado é responsável pela definição da data de corte para matrícula em seus sistemas de ensino, como ficarão as matrículas para 2019, como o Estado de São Paulo deverá agir e como deverão agir os pais que se sentirem prejudicados diante de uma eventual proibição de matrícula na série desejada.

A decisão ainda não foi redigida e ainda cabe recurso, por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR), que foi a Autora da ADPF 292, ajuizada contra duas normas do CNE (Resoluções 01 e a 06 de 2010 do CNE).

Tenho acalmado e explicado aos meus clientes que já entraram com ação e que já tiveram suas sentenças confirmadas pelo Tribunal de Justiça, que será assegurado à criança que teve uma decisão judicial em seu favor, o direito de seguir a sua escolaridade, sem ter que voltar de série, por conta da decisão do Supremo Tribunal Federal.

Mas, preciso traduzir, juridicamente, o que significa esta decisão, por enquanto :

Não há decisão por escrito (que se chama acórdão). O Ministro Roberto Barroso, que redigirá o acórdão deste caso, provavelmente o fará em alguns dias. Este acórdão será publicado no Diário Oficial. E, mesmo depois de sua publicação, os efeitos deste acórdão não serão imediatos. Portanto, não adianta os pais ficarem desesperados, e explico o motivo a seguir :

Enquanto advogada atuante no Direito Educacional passei e acompanhei várias mudanças de data corte, aqui no Brasil. A mais impactante que acompanhei, foi a do Estado de São Paulo, no ano de 2.011, ocasião em que impetrei mais de 200 ações judiciais para garantir o direito de prosseguimento de escolaridade de meus clientes que corriam o risco de repetir de série.

Cumpre explicar que cada Estado é responsável pela instituição da data de corte que nele prevalecerá (a isto chamamos de competência concorrente dos Estados para legislar), de acordo com o seu sistema de ensino. Quem institui esta data de corte, dentro de seu Estado, é a Secretaria de Educação, através de seus Conselhos de Educação, que, por sua vez, realiza um estudo de como será realizada esta mudança e edita uma Deliberação, Resolução, Portaria ou Parecer manifestando-se sobre a implementação da data de corte escolhida pelo seu Estado.

A chamada competência concorrente que cada Estado tem para legislar sobre educação e ensino é atribuída pela nossa Constituição Federal. São Paulo, por exemplo, já se manifestou, em 2015, através de um Parecer, que não adotaria a data de corte de 31/03, em seu sistema de ensino, apesar e após a Decisão proferida nos autos do Recurso Especial nº 1.412.704 e assim o fez, mesmo tendo uma decisão, em âmbito nacional, determinando a legalidade da data de corte para 31/03. O mesmo fizeram outros Estados Brasileiros, após a decisão do Rec. Especial julgada pelo STJ em 2.015, quando alguns Estados continuaram usando a data de corte de 30/06 ou a de 31/12 para matrícula de seus alunos.

Toda mudança de data de corte requer um planejamento por parte de seu Estado e não será diferente, desta vez, caso os Estados que não adotaram, ainda, a data de corte de 31/03 resolvam adotar, após esta decisão do STF.

Pela minha experiência na área, afirmo que nem todos os Estados irão aderir ao disposto nesta decisão do STF. Como disse, precisamos saber o teor deste acórdão, para ver o que e se ele irá falar a respeito de como esta decisão deverá ser (ou nãoacatada pelos Estados Brasileiros.

Os casos individuais poderão e deverão continuar a serem analisados à individualmente, através de ações judiciais, e os alunos que comprovarem a sua aptidão para cursar determinada série, terão o direito de pleitear, em juízo, a matrícula na série desejada. Explico :

Há vários outros argumentos e fundamentos jurídicos que garantem o direito de continuidade do aluno em sua escolaridade, o direito adquirido e o fato consumado, bem como garantem o direito individual do aluno, segundo a sua capacidade para cursar determinada série.

Reafirmo, então, que os Conselhos de Educação de cada Estado terão que se manifestar, através de Pareceres, Deliberações, Portarias ou Leis sobre qual data de corte irão adotar em seu Estado e, se, a norma publicada pelo referido Estado prejudicar o direito de Educação e desenvolvimento da criança, os pais das crianças que forem prejudicadas pela data corte, sejam as que já estão em sua escolaridade em curso e corram o risco de serem obstadas em seu prosseguimento ou que os pais acreditam que seus filhos tenham capacidade de cursar a série seguinte (ainda que não esteja cursando a série anterior) e cujas crianças tenham sua capacidade e aptidão para cursar determinada série atestada  (seja pela escola ou por uma psicopedagoga)poderão discutir, judicialmente, e assim garantir o seu direito de matrícula na série almejada.

As perguntas que mais têm sido feitas pelos meus clientes :

Se a decisão proferida pelo STF irá afetar os casos já resolvidos pela Justiça ?

Minha resposta é : não deverão ser afetados os casos já julgados pela Justiça em segundo Grau (Tribunal de Justiça), pois temos a figura jurídica do Direito Adquirido e do Fato Consumado, que são princípios de ordem constitucional. Assim, os casos garantidos por decisão judicial serão preservados.Acredito, também, que os casos que já tiveram liminar e sentença confirmando a liminar deverão respeitar o direito adquirido da criança. Se houver recusa da escola, cabe ação judicial para garantir a matrícula e direito de seguir a escolaridade.

SOBRE COMO EU ACREDITO QUE O ESTADO DE SÃO PAULO IRÁ SE PORTAR DIANTE DA REFERIDA DECISÃO:

Estado de São Paulo não usa a data de corte de 31/03. Ele adotou a data de corte 30 de junho.

O Conselho Estadual de Educação, órgão normativo, deliberativo e consultivo do Sistema de Ensino do Estado de São Paulo em atendimento à nova regulamentação aprovou aDeliberação CEE nº 73/2008, que disciplina a implantação do Ensino Fundamental de 9 Anos, no âmbito do Sistema Estadual de Ensino e, em seu artigo 2º fixou em 30 de junho a data máxima para a completude dos 6 anos de idade, ou seja, o Conselho Estadual admitiu a matrícula de crianças de até 5 anos e meio no Ensino Fundamental.

Por sua vez, as normas do Conselho Nacional de Educação, que são objeto desta decisão julgada pelo STF (Deliberações 01 e 06 de 2010 do CNE) estabeleceram para as instituições de seu sistema a idade de 6 anos completos até 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula para o ingresso das crianças no primeiro ano do ensino fundamental e 04 anos para ingresso na educação infantil. Vejam que o Estado de SP, assim como outros Estados não adotam as Resoluções que foram consideradas como constitucionais pelo STF.

Em Parecer sobre o tema da data de corte, em 2015, o Conselho de Educação do Estado de São Paulo já se posicionou no sentido de que: “Não se pode deixar de considerar a questão sob o ponto de vista prático, pois eventual alteração da data de corte tenderia a causar grande e negativa repercussão sobre as crianças e, de resto, ao Sistema Estadual de Ensino, que há anos adotou a data mediana de 30 de junho, como data limite. Restringir o ingresso de crianças que tenham completados os 6 anos até 31 de março significaria impedir um contingente considerável criando ociosidade de vagas em um determinado ano, para fatalmente criar excesso de alunos no ano seguinte, em visível prejuízo pedagógico e administrativo, por tudo recomendando a manutenção da data hoje em vigor em São Paulo. A norma editada pelo Conselho Estadual de Educação é – sem dúvida – mais razoável que a norma do Conselho Nacional, uma vez que divide as crianças ingressantes no Ensino Fundamental em dois períodos iguais, ao menos em tese proporcionando melhor distribuição e acomodação nas salas de aula”.

Ações judiciais questionando a legalidade de tais atos propagaram-se por todo o País e irão continuar se propagando, sendo a maioria delas em defesa de direito individual do aluno que se sentir prejudicado.

As Resoluções 01 e 06 de 2010 do CNE contrariam a Constituição Federal, que assegura o acesso aos níveis mais elevados do ensino, segundo a capacidade de cada um, direito este de eficácia plena que não comporta restrição ou limitação por legislação infraconstitucional em detrimento da criança. Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente repete o texto acima, não havendo margem para imposição da restrição etária, sustentada pelo Conselho Estadual de Educação.

E, ainda, cite-se o precedente do Superior Tribunal de Justiçaa capacidade de aprendizagem da criança deve ser analisada de forma individual, não genérica, porque tal condição não se afere única e exclusivamente pela idade cronológica” (Resp 753.565-MS, rel. Min. Luiz Fux).

Entendo que as orientações expedidas pelos Conselhos de Educação, atos meramente administrativos, não podem obstar o direito constitucional da criança ao seu regular desenvolvimento intelectual.

Então, meu conselho aos pais que se encontram nesta situação de insegurança acerca da escolaridade de seu filho, que aguardem os próximos passos com a redação do acórdão, o que ele irá ou não definir e como os Conselhos de Educação de cada Estado irá reagir diante desta decisão. As escolas são obrigadas a seguir as determinações dos Conselhos de Educação. Porém, caso a escola se pronuncie no sentido de proibir o avanço ou a matrícula da criança, na série desejada, por conta da data de corte, os pais conseguindo provar a aptidão da criança para cursar a série desejada, poderão entrar com ação judicial, cabendo pedido de liminar, para garantir o direito da criança de seguir a sua escolaridade.

Por enquanto, só lhes resta aguardar, mas, saibam que o Judiciário tem sido bem receptivo com estes casos de crianças que provam que têm aptidão para serem matriculadas na série desejada (seja para evitar a retenção, o retrocesso de série, seja para o avanço de série pretendido, bem como o Judiciário não vê com bons olhos, a criança ter que voltar de série só para atender uma Deliberação administrativa do Conselho de Educação.

Assim sendo, diante de tal decisão proferida pelo STF, acredito que os casos individuais ainda poderão ser apreciados e julgados de maneira individualizadas e subjetivas pelo Judiciário, uma vez comprovada a aptidão da criança em seguir a sua escolaridade.

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